São quatro da manhã, e ele permanece acordado. Lá fora, um galo com o relógio adiantado vai cantando sozinho. A noite faz-se acompanhar de fantasmas e enquanto ele recorda a vida, o cigarro queima lentamente no cinzeiro, que quase transborda cinza. São assim as suas noites, passadas em claro a recordar um passado que teima em ser presente. No entanto, continua sem futuro. O cigarro já não arde, chegou ao filtro. Mas ele nem repara, continuando perdido no tempo. Tempo esse que vai passando sem que ele note. Finalmente, a mente regressa ao corpo. Faltam agora dez minutos para as cinco. Ele olha em redor, e a cortina mexe-se. Levanta-se da cadeira, onde repousa há seis horas, e fecha por completo a janela. A lua olha-o com desconfiança, enquanto um morcego dança com o poste de electricidade. Ele afasta-se. A noite está demasiado sombria. Olha novamente em seu redor e constata que o quarto está repleto de memórias. Avança até à prateleira de onde retira uma garrafa. Acende um cigarro e volta a sentar-se. É então que, entre umas passas no cigarro, afoga os seus fantasmas num copo de Gin. É este o seu antídoto. É este o seu truque para que quando acordar, possa viver sem problemas. Até que volte a sentar-se naquela cadeira, e recomece a recordar.