Pombal, 14 de Outubro de 2006
Estou no local a que se dá por nome de Bixo. Pedi ao Sr.Mário um pequeno papel e uma caneta. Ele aprovou, parecendo adivinhar que necessitava de escrever.
Vi ali sentado um menino, um menino como outro qualquer. Totalmente alheado aos maus exemplos que aqui o rodeiam. Mas não são maus exemplos pelo que fazem. Respeito, admiro. São maus exemplos pelo que não o conduzirão a fazer, pelo mundo que lhe não irão conseguir abrir. Um mundo que não conhecem, porque também eles foram meninos, mergulhados nos mesmos exemplos de desistência. Também eles uma vez foram meninos que deixaram de acreditar. Exemplos desse tal mundo que também nunca ousaram poder conhecer. São filhos das gentes. Das gentes que precisaram de crescer à velocidade da fome. Condenados ao tempo em que nasceram. Condenados à cegueira, ao campo atrasado de tão infértil e cruel, condenados à fábrica barulhenta, de tão mecanizada e frustrante.
Estes homens têm tanta culpa do que são, mas tão pouca culpa do que se tornaram…
Tenho pena deste menino. Existe tanta possibilidade em ser pobre e genial como em ser rico e improdutivo. Existe uma vã esperança em ser sonho concretizado. Sonha menino! Sonha e lança sonhos ao mundo, os teus e os meus se puderes. Lança aquilo que me faz acreditar em tudo o que os privilegiados fazem este mundo esquecer.
Quero orgulhar-me de ti criança. Como as outras tão diferente na condição. Foste votado ao mundo onde nasceste. Como eu, como os teus pais, como todos, votados à condição.
Condenem-nos a todos à imprecisa e esquecida liberdade, não a essa de ir votar aos Domingos, mas à liberdade de querer nascer igual.
Quero essa, a liberdade frustrada desde o pó egípcio sobre o Nilo às labaredas de Roma, essa falhada de Carlos Magno ao Império da Áustria, essa perdida no fundo convenientemente esquecido dos baú Romanov às artes dos Médicis de Florença.
Essa menino. Talvez não consigas, talvez nem consigas ser menino, talvez seja um sonho.
Quero sonhar assim, toda a vida assim…